Como todo país em desenvolvimento, tem os seus problemas: a educação, a saúde, e muitos outros. Entre esses, está a situação das pessoas portadoras de deficiência física. Vítimas de problemas congênitos, enfermidades ou causas traumatólogicas, perfazem 10% de todo o seu contingente.
Como toda minoria, são relegadas a segundo plano, visto não existir uma consciência popular valorativa sobre os seus potenciais, como se a cabeça estivesse na disfunção de um membro locomotor ou no atrofiamento de um braço.
É o retrato de um país que não encara os seus problemas, não sabe transformá-los, aceitando, apenas, os fortes, perfeitos e vencedores.
A sociedade não sabe conviver com essas pessoas. Ainda não conseguiu entender que o maior potencial humano é a mente e, se essa está ilesa, a vida é possível e o trabalho é digno dentro da capacitação.
A informação e o espírito de solidariedade ainda são muito pequenos entre nós. Nunca paramos para pensar como é o dia-a-dia de uma pessoa que tem por pernas quatro rodas de uma cadeira. Estamos sempre ocupados com os nossos próprios problemas, esquecendo-nos de que as fatalidades não avisam, nem escolhem status. Quando deparamos com alguém de muletas ou cadeira de rodas, a idéia é de que está aposentado ou aposentando, embora sirvam as pernas, apenas, para cumprir a simples missão de andar. E, se a pessoa for do sexo feminino, principalmente, presume-se logo que jamais encontrará companheiro, ou, se a seqüela for recente, fatalmente será abandonada por ele.
É como se, de repente, o ser humano se transformasse num objeto sem valor.
É raro vermos uma pessoa deficiente física ocupando um cargo público de comando e, se a fatalidade ocorre durante o exercício do dele, a aposentadoria é compulsória, sem nenhuma chance de readaptação dentro do órgão. Sequer, pensa-se numa transferência para outro cargo mais compatível com a limitação física adquirida. Simplesmente, descarta-se.
Afinal, estamos na era dos descartáveis. É um marco da personalidade brasileira e do machismo arraigado de governantes desinformados que não sabem buscar, transformar, aproveitar, mesmo tanto tempo depois da teoria de Lavoisier: "...nada se perde, tudo se transforma". Quando uma parte do corpo se fragiliza, as outras se encarregam do trabalho, provando que não há problema sem solução.
A mídia é a grande responsável por essa imagem, tão negativa, do deficiente físico. Fulcrada em desinformações, as novelas banem até a sua sexualidade, forçando-o, mesmo, a tornar-se um cadáver vivo. Estar deficiente, fisicamente, não significa estar assexuado. Sempre há uma saída, tendo em vista a lei da compensação e a perfeição da natureza. É costume, também, mostrar a penúria, a fatalidade, a invalidez do incapacitado físico, e nunca o seu trabalho digno, a sua competência, o seu esforço para vencer barreiras. Vê-se sempre o invólucro, e nunca o conteúdo. É pena que não entendam que do mínimo indispensável é possível construir uma obra de arte. "O essencial é mesmo invisível aos olhos. É preciso buscar com o coração".
Apesar de não sermos detentores dos nossos movimentos físicos, não precisamos da caridade pública e não devemos ser excluídos do sistema sócio-econômico e político do país. Precisamos ser reconhecidos como força de trabalho, com o direito de competirmos e mostrar que somos capazes, quebrando tabus, preconceitos e discriminações. "...tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam". Sabedoria máxima de Rui Barbosa, que bem pode ser aplicada aos incapacitados físicos. Afinal, somos desigualdades, mas merecemos respeito e temos o direito de legar a nossa participação de trabalho.
_em empresas, com mais de 100 empregados, a deficientes. Na medida em que a sociedade provê meios para que o deficiente possa atuar produtivamente no sistema capitalista em que vivemos, estará realizando um investimento social, vez que o deficiente deixará de ser um consumidor de políticas de previdência e assistência social para capacitar-se como produtor de receitas públicas mediante o recolhimento de impostos sobre sua atividade profissional.
Assim, estaremos participando e ostensivamente reivindicando o nosso espaço, pois, primeiro o fato social, depois as normas. Sabe-se que casas de diversões públicas, com capacidade para mais de 100 pessoas, deverão ter acesso e banheiros adaptados para deficientes, bem como restaurantes e hotéis. Pena, que os já existentes - pseudos banheiros adaptados - nada têm a ver conosco. São somente fachadas. Embora exibam grande adesivo do deficiente físico, apenas iludem os andantes e servem aos muletantes. É como se, de repente, a gente num passo de mágica pudesse ficar de pé, empurrar a cadeira para fora, fechar a porta e sentar- se no vaso, dada a exiguidade de espaço e a falta de conhecimento sobre o dia-a-dia de um cadeirante, além do desrespeito ao seu pudor. Não há consciência popular. Nesses empreendimentos não há consulta prévia aos seus reais usuários. É como se fosse a feitura de obras eleitoreiras. Lamentável!
Sabemos que nem todos os artigos são auto-aplicáveis, necessitando de leis regulamentadoras (federais, estaduais e municipais), que morosamente arrastam-se pela burocracia. Mas, já é um avanço que tem melhorado a qualidade de vida do deficiente físico, aumentando-lhe a auto-estima e proporcionando-lhe o sustento com o próprio trabalho. Ouso dizer que não se deve dar ao homem o que ele pode conseguir com fruto do seu trabalho, sob pena de roubar-lhe a dignidade.
Depois, é o trabalho uma verdadeira terapia, que nos devolve o sentimento de utilidade e a oportunidade merecida para provarmos que poderemos ser, não apenas força produtiva, mas, força transformadora para aumentar a esperança em um país justo e progressista, diminuindo-lhe os problemas sociais, além de servirmos de motivação e incentivo aos muitos paralíticos andantes, que se estribam numa ociosidade crônica para nada fazerem ou mal fazerem.
Com a abertura do mercado de trabalho, através da Carta Magna, chegou a hora de provar a que viemos. Chegou a hora de mostrarmos à sociedade que o mais perfeito caminhar executa-se com mente, além do famoso "querer é poder". Chegou a hora de darmos exemplo.
Não obstante os muitos cerceamentos que sofremos na pele, impostos pela deficiência, temos que rebatê-los com uma só ação: CORAGEM de ir à luta e vencer, deixando sempre à amostragem a competência, o preparo técnico científico peculiar ao desempenho da função que conquistarmos, nunca nos escudando sob o pretexto da deficiência para auferirmos vantagens ou buscar protecionismo. Não há discriminação que resista à competência.
Agora, resta-nos exigir o cumprimento das leis na satisfação dos direitos. Necessário se faz um trabalho conscientizador a partir do próprio deficiente, da sua família (que deve se engajar) até à sociedade e governantes, tão desinformados sobre os potenciais humanos. É preciso que a sociedade troque os sentimentos de paternalismo, compaixão ou desprezo por outros valorativos, respeitosos e reconhecedores, devolvendo ao deficiente físico a cidadania, o direito de participar dessa caminhada que chamamos de VIDA.
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